O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta segunda-feira (28) que a defesa de Fernando Collor apresente em até 48 horas todo o prontuário médico, exames e histórico clínico do ex-presidente. A decisão faz parte do processo em que a defesa pleiteia a prisão domiciliar humanitária, alegando que Collor, de 75 anos, sofre de doença de Parkinson, apneia do sono grave e transtorno afetivo bipolar. Em despacho com pedido de sigilo absoluto dos documentos, Moraes condiciona a análise do pedido ao exame rigoroso das condições de saúde de Collor, preso desde a madrugada de sexta-feira (25) em Maceió.
Breve histórico do caso
Após o trânsito em julgado de sua condenação pela 2ª Turma do STF, Collor foi sentenciado a 8 anos e 6 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no esquema da BR Distribuidora (hoje Vibra Energia). A acusação, relatada a partir da delação de Ricardo Pessoa, ex-presidente da UTC, aponta que o ex-chefe do Executivo recebeu R$ 20 milhões entre 2010 e 2014 em troca de apoio político e indicações para a estatal.
Horas depois de a decisão se tornar definitiva, Alexandre de Moraes negou os embargos infringentes da defesa e expediu mandado de prisão imediata — em linha com o entendimento de que recursos protelatórios não suspendem a execução da pena. Collor se entregou voluntariamente por volta das 4 h de sexta-feira em Maceió, onde aguardou em cela da Polícia Federal até nova posição do STF.
Pedido de prisão domiciliar: fundamentos e argumentos
No dia seguinte à prisão, a defesa ingressou com habeas corpus humanitário junto ao STF, destacando:
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Idade avançada (75 anos).
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Parkinson em estágio inicial, com tremores e rigidez.
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Apneia do sono grave, que exige equipamento de pressão positiva contínua (CPAP).
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Transtorno bipolar, controlado com medicação diária.
Os advogados afirmam que o ambiente prisional, com celas pouco ventiladas e acesso restrito a especialistas, agrava o quadro de saúde e aumenta risco de complicações. Propondo regime domiciliar em apartamento de cobertura na orla de Maceió — onde Collor reside e já contaria com assistência médica —, a defesa requer uso de tornozeleira eletrônica e acompanhamento remoto por equipe especializada.
O despacho de Moraes e os próximos passos
No despacho, Moraes mandou:
“Junte-se, no prazo de 48 horas, o prontuário, histórico e exames de Collor, em caráter sigiloso, para preservar sua intimidade, nos termos do artigo 5º, X, da Constituição.”
A partir da entrega, o processo seguirá estas fases:
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Análise preliminar: assessores verificam a completude dos laudos.
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Parecer da PGR: a Procuradoria-Geral da República emitirá opinião sobre o pedido.
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Perícia oficial: o STF poderá nomear perito médico para confirmar diagnósticos.
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Decisão: Moraes poderá deferir liminar monocrática ou levar ao plenário, dependendo da gravidade e do consenso.
Caso a liminar seja concedida, Collor poderá cumprir o restante da pena em aparato domiciliar com restrições rígidas. Se o pedido for negado, a defesa pode recorrer ao plenário do STF ou ao Superior Tribunal de Justiça.
##Gilmar Mendes e o destaque para sessão no plenário
Na sexta-feira, o ministro Gilmar Mendes pediu destaque à prisão de Collor, suspendendo temporariamente o andamento e determinando inclusão do caso no plenário físico do STF. Mendes justificou a necessidade de debate amplo sobre:
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Natureza dos recursos protelatórios versus direitos fundamentais.
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Critérios para concessão de prisão domiciliar em casos de saúde.
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Uniformidade de jurisprudência sobre clinica prisional e assistência médica.
A sessão ainda não foi marcada, mas deve reunir ministros que divergem sobre a extensão de medidas humanitárias a réus de alta relevância política.
Comparativos e precedentes no Brasil
Decisões anteriores mostram caminhos distintos:
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João de Deus (2018): preso por crimes sexuais, obteve domiciliar após diagnóstico de câncer e risco de sepse.
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Coronel Ustra: teve pedido negado apesar de diagnóstico de neoplasia.
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Lobão Filho (2019): em prisão provisória, conseguiu domiciliar por quadro cardíaco sério.
Internacionalmente, ex-chefes de Estado como Silvio Berlusconi (Itália) e Alberto Fujimori (Peru) cumpriram penas domiciliares por questões de saúde, estabelecendo parâmetros que o STF observa paralelamente.
Repercussão política e opinião pública
O caso polariza líderes e opinião pública. O PT e partidos de esquerda criticam o privilégio, afirmando que “não há presidiário acima da lei”. Parlamentares do centrão, por outro lado, defendem a medida como direito à dignidade humana. Nas redes sociais, movimentam-se duas correntes:
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#SaúdeEmPrimeiroLugar: apoia prisão domiciliar para Collor.
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#IgualdadePeranteLei: cobra rigor igualitário sem privilégios.
Especialistas em direito penal alertam para o risco de exceção ampliada, que poderia fragilizar o regime fechado como regra.
Desafios para o sistema carcerário e civil
A situação de Collor evidencia carências do sistema prisional brasileiro:
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Infraestrutura médica insuficiente: presídios carecem de equipamentos para tratamento de doenças crônicas.
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Proximidade hospitalar: rotinas de transferência a hospitais públicos são lentas e burocráticas.
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Segurança versus saúde: instalação de tornozeleira impõe desafio logístico a superintendências regionais.
Reforça-se a urgência de reforma penitenciária que proporcione unidades hospitalares ou alas especializadas, além de protocolos ágeis para diagnósticos e tratamento.
Cenários e impactos do desfecho
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Prisão domiciliar liminar: abre precedente para réus idosos ou com comorbidades, amplia debates sobre assistência penal.
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Manutenção do regime fechado: sinaliza rigor igualitário, mas pode expor Collor a risco de saúde e gerar novas ações humanitárias.
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Plenário do STF: decisão colegiada tende a sólida jurisprudência, mas retarda desfecho e prolonga incerteza.
Além disso, a medida afetará imagem internacional do Brasil quanto ao respeito a direitos humanos e às normas penais, especialmente diante de órgãos como ONU e OEA.
Equilíbrio entre lei e vida
O despacho de Moraes coloca o STF no epicentro de um dilema constitucional: como conciliar a execução imediata de pena com proteção à vida e à dignidade de réus doentes? A análise dos laudos nos próximos dois dias será determinante para definir se Collor terá o conforto e a segurança de casa ou seguirá em regime fechado. De qualquer forma, o desfecho servirá de parâmetro para futuros casos e testará a capacidade da Justiça de aplicar princípios humanitários sem abalar o princípio da igualdade.