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Francisco, da infância à eleição papal: a travessia de um pastor vindo do fim do mundo

Antes de se tornar o primeiro papa jesuíta e o primeiro latino-americano a assumir o trono de Pedro, Jorge Mario Bergoglio foi filho de imigrantes italianos, técnico químico, bispo de Buenos Aires e um homem que escolheu caminhar entre os pobres. Sua trajetória é marcada por gestos discretos, mas carregados de rupturas silenciosas — até o dia em que apareceu na sacada da Basílica de São Pedro, em 13 de março de 2013, e mudou para sempre a face da Igreja.

por brunojorge
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As origens: um filho da classe trabalhadora

Jorge Mario Bergoglio nasceu em 17 de dezembro de 1936, no bairro de Flores, na cidade de Buenos Aires. Era o mais velho dos cinco filhos de Mario José Bergoglio, um contador ferroviário, e Regina María Sívori, dona de casa. Seus avós paternos haviam emigrado da cidade de Portacomaro, na região do Piemonte, norte da Itália — herança que moldaria sua identidade espiritual e seu modo de ser.

Cresceu em uma casa modesta e conviveu com a realidade de uma Argentina marcada por instabilidade política e desigualdade social. Ainda jovem, mostrou talento para os estudos, especialmente em ciências. Estudou no Instituto Técnico Industrial Hipólito Yrigoyen e formou-se técnico químico em 1958. Trabalhou por um tempo em um laboratório, mas esse não seria seu caminho definitivo.


O chamado inesperado

Em 1957, aos 20 anos, enfrentou uma grave infecção respiratória que levou à remoção parcial de seu pulmão direito. Durante a internação, viveu uma experiência espiritual intensa, que ele mais tarde descreveria como decisiva. Sentiu-se chamado ao sacerdócio.

Ingressou no seminário diocesano de Villa Devoto e, posteriormente, no noviciado da Companhia de Jesus em março de 1958. Escolheu os jesuítas por sua formação intelectual exigente, espiritualidade ativa e compromisso com os marginalizados. Estudou humanidades, filosofia e teologia na Faculdade de San Miguel.

Foi ordenado sacerdote em 13 de dezembro de 1969, por Dom Ramón José Castellano, arcebispo de Córdoba.


Líder sob pressão: a ditadura e os dilemas do silêncio

Em 1973, aos 36 anos, foi nomeado Provincial dos Jesuítas na Argentina, durante os anos que antecederam o período mais brutal da ditadura militar (1976–1983). Adotou uma postura de reserva e prudência, que mais tarde lhe traria críticas, especialmente pelo episódio envolvendo os padres Orlando Yorio e Francisco Jalics, detidos pelo regime.

Anos depois, o próprio padre Jalics — um dos detidos — afirmaria que Bergoglio tentou protegê-los, contradizendo a narrativa de omissão. A documentação histórica e testemunhos posteriores reforçam que Bergoglio agiu discretamente para esconder perseguidos e interceder por libertações. Nunca se defendeu com veemência. Preferia o silêncio — e, nele, havia coerência.


Um pastor urbano, entre trens e vilas

Após anos como formador e reitor do colégio jesuíta, Bergoglio foi nomeado bispo auxiliar de Buenos Aires em 1992, por João Paulo II. Em 1998, assumiu como arcebispo metropolitano, sucedendo o cardeal Antonio Quarracino.

Como arcebispo, recusou as formalidades e viveu com simplicidade: cozinhava sua comida, andava de transporte público, visitava presídios e as “villas miserias” (favelas argentinas). Tornou-se um símbolo de proximidade e coerência pastoral.

Em 2001, foi criado cardeal por João Paulo II, recebendo o barrete vermelho no Consistório de 21 de fevereiro. Em sua volta à Argentina, pediu aos fiéis que não viajassem a Roma para comemorar — e que usassem o dinheiro para ajudar os necessitados.


A figura discreta no conclave de 2005

Após a morte de João Paulo II, participou do conclave de 2005, que elegeu Joseph Ratzinger como Bento XVI. Reportagens e livros, como El Jesuita e A Última Palavra, sugerem que Bergoglio recebeu uma quantidade significativa de votos na fase final, mas teria solicitado aos cardeais que retirassem seu nome da disputa, por considerar-se inadequado para o papel.

Ele retornou a Buenos Aires ainda mais discreto, mas passou a ser respeitado globalmente como uma referência de sobriedade e espiritualidade pastoral.


2013: uma Igreja em crise, um conclave decisivo

O Vaticano enfrentava turbulências: escândalos de corrupção, disputas internas reveladas pelo caso Vatileaks e crescente distanciamento com o mundo contemporâneo. Em fevereiro de 2013, Bento XVI renunciou — o primeiro papa a fazê-lo em quase 600 anos.

No conclave de março de 2013, 115 cardeais reuniram-se para eleger o novo líder espiritual da Igreja. A escolha de Bergoglio, até então vista como improvável, surgiu como resposta à necessidade de mudança, autenticidade e reforma.


“Vocês foram buscar o papa no fim do mundo”

Na quinta votação, em 13 de março, Jorge Mario Bergoglio foi eleito com 77 votos. Às 19h06, a fumaça branca apareceu sobre a Praça São Pedro. Às 20h12, o cardeal Jean-Louis Tauran anunciou: Habemus Papam!

Na sacada da Basílica, sob aplausos e expectativa global, Bergoglio fez história: tornou-se o primeiro papa jesuíta, o primeiro latino-americano, o primeiro do hemisfério sul — e o primeiro a adotar o nome Francisco, em referência a São Francisco de Assis.

Sua primeira frase pública ressoou com simplicidade:

“Parece que meus irmãos cardeais foram buscá-lo no fim do mundo… mas aqui estamos.”


Um nome, um manifesto

Escolher o nome Francisco não foi apenas uma homenagem. Foi um recado. São Francisco de Assis representava pobreza, humildade, paz e cuidado com a criação — os mesmos valores que marcariam o novo papado.


Um novo tempo começava ali

Naquele instante, 13 de março de 2013, não foi apenas um papa que se apresentou ao mundo. Foi o início de uma nova narrativa para a Igreja Católica: mais aberta, mais social, mais consciente da dor do mundo.

Francisco não apenas assumiu o trono de Pedro — ele o desceu. E convidou a Igreja a caminhar junto com o povo, a escutar antes de doutrinar, a servir antes de governar.

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