O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reagiu nesta quarta-feira (30) aos dados divulgados pelo Departamento de Comércio, que apontaram uma contração de 0,4% no Produto Interno Bruto (PIB) americano no primeiro trimestre de 2025.
Em publicação na plataforma Truth Social, Trump rejeitou qualquer responsabilidade por parte de suas políticas tarifárias e assegurou que a economia norte-americana viverá em breve um crescimento sem precedentes:
“Quando o boom começar, será como nenhum outro. SEJAM PACIENTES!!!”, escreveu o presidente.
A fala ocorre no momento em que os Estados Unidos registram a primeira retração econômica desde o terceiro trimestre de 2022, o que reacendeu debates sobre os riscos associados ao endurecimento da política comercial americana e à fragmentação das cadeias produtivas globais.
Os números do PIB: abaixo das expectativas
De acordo com a estimativa preliminar do Departamento de Comércio, a economia dos EUA encolheu 0,4% entre janeiro e março de 2025, em termos anualizados.
A expectativa de analistas de mercado era de crescimento entre 0,5% e 0,8%, o que torna o resultado ainda mais preocupante. A contração foi puxada por:
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Queda de 1,2% nos gastos das famílias, que representam cerca de 70% do PIB;
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Redução de 1,8% nos investimentos privados, especialmente no setor industrial;
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Recuo nas exportações líquidas, influenciado por tarifas retaliatórias de parceiros comerciais.
Esse desempenho fraco ocorre após o crescimento de 2,2% no quarto trimestre de 2024, e se mantido no segundo trimestre, configurará recessão técnica — caracterizada por dois trimestres consecutivos de retração econômica.
Tarifas sob escrutínio
Desde o retorno de Trump à presidência, em janeiro de 2024, os EUA voltaram a adotar uma política comercial agressiva, com foco em tarifas e restrições a importações estratégicas, sobretudo vindas da China.
As ações incluem:
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Elevação de tarifas sobre eletrônicos, aço, semicondutores e fertilizantes;
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Incentivos fiscais para empresas que transferirem produção de volta aos EUA;
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Suspensão de acordos comerciais multilaterais considerados “injustos” pela Casa Branca.
A justificativa do governo é que essas medidas fortaleceriam a indústria nacional, aumentariam a autossuficiência produtiva e reduziriam riscos geopolíticos — sobretudo em áreas sensíveis como tecnologia, energia e defesa.
Porém, economistas alertam que os efeitos colaterais podem ser significativos a curto prazo, ao elevar custos de produção, gerar represálias comerciais e pressionar o consumo.
“Há um choque simultâneo de custos e incerteza. As tarifas reduzem o apetite por investimento e aumentam o preço final ao consumidor”, afirmou Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s Analytics.
O “boom” prometido e o custo da espera
A promessa de Trump de que os efeitos positivos das tarifas ainda virão é central para sua narrativa política e econômica. Ele defende que a contração atual é temporária e necessária para o que chama de “reconstrução produtiva dos Estados Unidos”.
Seus assessores comparam a situação a uma “fisioterapia econômica”, em que o país passa por um período de ajuste com vistas à reindustrialização doméstica e fortalecimento da soberania econômica.
No entanto, dados do mercado de trabalho, do comércio e da inflação indicam uma economia sob estresse:
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A inflação acumulada em 12 meses está em 3,6%, acima da meta de 2%;
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O consumo das famílias, após forte expansão entre 2022 e 2023, entrou em desaceleração;
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O índice de confiança do consumidor recuou pelo terceiro mês consecutivo, segundo o Conference Board.
Para os críticos, a retórica presidencial mascara os impactos reais da política comercial, que pode ter encarecido produtos essenciais, reduzido margens do varejo e travado exportações agrícolas e industriais.
Reações políticas: Congresso dividido
As reações no Capitólio foram polarizadas. A ala republicana mais próxima de Trump apoiou a narrativa de que o recuo no PIB é um “ajuste estratégico”.
Já parlamentares democratas e moderados expressaram preocupação.
“Trump está jogando com a economia americana como se fosse um reality show. A conta chegou — e quem está pagando é o trabalhador”, disse o senador democrata Jon Tester.
A Federação Nacional da Indústria, que representa grandes fabricantes, alertou que o impacto das tarifas sobre insumos e maquinários pode inibir investimentos e desorganizar cadeias de produção que levaram décadas para serem consolidadas.
O mundo reage: tensões comerciais se intensificam
Os efeitos da nova postura dos EUA já provocaram retaliações de parceiros comerciais, especialmente da União Europeia e da China, que anunciaram tarifas sobre produtos agrícolas americanos e empresas do setor de defesa.
Além disso, organismos multilaterais como o FMI e a OMC alertaram que o retorno de políticas protecionistas pode afetar o crescimento global, com redução nos fluxos de comércio e investimentos cruzados.
O Banco Mundial, em seu relatório de abril, já havia revisado para baixo a previsão de crescimento dos EUA em 2025, passando de 2,1% para 1,1%.
Perspectivas: risco de recessão ou virada estratégica?
O segundo trimestre será decisivo. Caso o PIB volte a registrar desempenho negativo, os EUA entrarão oficialmente em recessão técnica.
Apesar disso, há fatores que podem contribuir para uma retomada:
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Programas de investimento público em infraestrutura e energia limpa;
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Incentivos para microchips e semicondutores via CHIPS Act;
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Recuperação gradual da renda média real dos trabalhadores.
Mas tudo dependerá de uma coordenação eficaz entre política fiscal, monetária e comercial — o que exige clareza estratégica, algo ainda ausente no governo Trump, segundo analistas.
A promessa de um boom em meio a um cenário de retração
A economia dos EUA encolheu no 1º trimestre de 2025, e embora o governo negue responsabilidade, as políticas adotadas desde o retorno de Trump ao poder estão no centro das análises econômicas.
A retórica do “boom inevitável” pode funcionar como escudo político, mas não substitui os fundamentos macroeconômicos.
Se a recuperação prometida não se concretizar nos próximos trimestres, o risco de erosão de credibilidade e de entrada em recessão se tornará real — e com custo político elevado em ano pré-eleitoral.