O efeito das tarifas impostas pelo governo Trump começará a chegar aos bolsos dos americanos no final de maio de 2025, afirmou Gary Cohn, ex-diretor do Conselho Econômico Nacional, em entrevista ao programa Face the Nation da CBS. Segundo ele, famílias de baixa renda — que destinam toda a sua remuneração a bens de consumo — enfrentarão um aumento de preços proporcionalmente maior, enquanto os mais ricos conseguirão amortecer o impacto e manter economias mais robustas.
Linha do tempo: por que maio será o mês do choque
Cohn explica que a cadeia logística de importação até o varejo leva cerca de quatro a seis semanas, cobrindo transporte marítimo, desembaraço na alfândega e distribuição nacional. Assim:
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Início de abril: tarifas entram em vigor sobre US$ 325 bi em produtos chineses (25 %) e sobre demais importações (10 %).
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Final de maio: empresas repassam custos aos atacadistas e varejistas, elevando preços nas prateleiras.
“À medida que os atacadistas incorporam tarifas em suas planilhas de custo, supermercados e lojas de departamento repassam o ajuste ao consumidor”, observou Cohn.
Quanto as tarifas já pressionam a inflação
Em resumo, três indicadores apontam para alta de preços:
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CPI de março: o Índice de Preços ao Consumidor caiu 0,1 % no mês, mas sobe 2,4 % em 12 meses, segundo o Departamento do Trabalho dos EUA
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Swaps de inflação: contratos de um ano precificam inflação média de 3 % para os próximos doze meses, alta em relação à meta do Fed
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PMI composto: o índice de atividade dos negócios recuou para 51,2 em abril, no menor nível em 16 meses, e sinalizou repasse de custos a preços
Portanto, embora a inflação tenha arrefecido temporariamente, o aumento de tarifas tende a gerar um novo impulso inflacionário — episódio já batizado por alguns analistas de “tsunami tarifário”.
Efeito regressivo: quem mais perde
As tarifas são consideradas regressivas, pois pesam proporcionalmente mais no orçamento de quem ganha menos. Cohn ressaltou:
“Famílias de baixa renda gastam 100 % do salário em bens essenciais; qualquer alta de preço reduz poder de compra e agrava desigualdade.”
De fato, pesquisas apontam que quem dedica mais de 35 % da renda a custos fixos (aluguel, transporte, energia) está mais vulnerável a choques de oferta. Para essas famílias, um aumento de 5 % nos preços de alimentos e produtos de higiene pode significar cortar gastos com remédios ou educação.
Reações do Federal Reserve e tensão política
O cenário tarifário coincide com tensões entre o presidente Trump e o Federal Reserve. Após a divulgação de dados de inflação mais altos, o mandatário criticou Jerome Powell de “grande perdedor”, mas garantiu não pretender demiti-lo. Apesar disso, o mercado precifica o primeiro corte de juros para junho, depois de uma pausa iniciada em janeiro.
No entanto, Cohn adverte que:
“Reduzir juros demais pode inflar bolhas de ativos e agravar desigualdade de riqueza”, alerta
Impactos nas cadeias produtivas e emprego
Além do impacto ao consumidor, as tarifas redesenham cadeias de suprimento:
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Automóveis: fabricantes transferem partes da produção para o México ou Europa para escapar de alíquotas de 25 %.
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Eletroeletrônicos: custos de componentes sobem, levando empresas a adotar automação e repensar linhas de montagem.
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Aeroespacial: tarifas sobre peças encarecem manutenção de frotas e elevam despesas operacionais de companhias aéreas
Assim, embora o governo espere reindustrializar o país, o curto prazo traz riscos de redução de vagas de trabalho de baixa qualificação e adiamento de investimentos.
Medidas paliativas e caminhos de mitigação
Para proteger os mais vulneráveis, economistas recomendam:
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Expansão do Earned Income Tax Credit (EITC), compensando famílias de baixa renda pelo aumento de preços.
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Tarifas diferenciadas: alíquotas menores para produtos básicos (alimentos, medicamentos) e mais altas para itens supérfluos.
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Incentivos à produção doméstica de bens essenciais, reduzindo dependência de importações.
Além disso, propostas de acordos comerciais setoriais poderiam isentar insumos críticos das tarifas, preservando cadeias produtivas fundamentais.
Perspectivas eleitorais e ambiente global
Em um ano eleitoral, a política comercial ganha contornos ainda mais sensíveis. Regiões do Rust Belt, historicamente afetadas por desindustrialização, poderão levar o tema ao centro da campanha legislativa.
No plano internacional, o Fundo Monetário Internacional já revisou para baixo as estimativas de crescimento global em função das tarifas — de 3,3 % para 2,8 % em 2025 — apontando riscos de recessão nos principais parceiros comerciais dos EUA. Ademais, um poll da Reuters revelou que 92 % dos economistas veem os impostos sobre importados como negativos para a economia mundial
Calibrar proteção e equidade
O alerta de Cohn expõe o dilema central de toda guerra comercial: proteger indústrias nacionais sem penalizar desproporcionalmente os mais pobres. Se, por um lado, tarifas podem oferecer fôlego a setores estratégicos, por outro, elevam custos de vida e ameaçam a coesão social. Portanto, caberá ao governo federal — em parceria com o Congresso — equilibrar políticas compensatórias, ajustes tarifários e reformas estruturais para garantir que o choque de maio não se transforme em crise prolongada.