A semana que começou sob a nuvem carregada de uma iminente guerra comercial generalizada termina sua quarta-feira (9) e inicia a quinta-feira (10 de abril de 2025) com os mercados globais tentando digerir uma série estonteante de escaladas, reviravoltas e anúncios conflitantes vindos da administração Trump.
No Brasil, a montanha-russa foi particularmente intensa: após uma queda expressiva que levou o dólar a R$ 5,84 na véspera, a moeda americana voltou a subir mais de 2% nesta quinta, negociada perto de R$ 5,94. O Ibovespa, que havia celebrado com alta superior a 3% na quarta, devolvia parte dos ganhos, caindo 1,20%. Em Nova York, o cenário era similar, com Wall Street em forte baixa (-3% a -4.5%). Esta reversão abrupta, ocorrendo menos de 24 horas após uma das maiores altas diárias em anos, encapsula a crônica de uma semana marcada pela volatilidade extrema impulsionada pelas tarifas de Trump e pela incerteza sobre os rumos do comércio global.
A Tempestade se Forma: O ‘Tarifaço’ Inicial e as Retaliações
Para entender a gangorra dos mercados, é preciso recapitular a rápida sucessão de eventos. A semana efetivamente começou sob tensão com a entrada em vigor de novas tarifas americanas sobre diversos países em 2 de abril, uma medida que já vinha sendo sinalizada por Donald Trump. A resposta não tardou: na sexta-feira (4), a China anunciou suas primeiras tarifas retaliatórias (34%). O cenário para um confronto direto estava montado.
Quarta-Feira Elétrica: Do Abismo à Euforia em Poucas Horas
A madrugada e manhã de quarta-feira (9) viram a tensão escalar dramaticamente:
- Os EUA implementaram tarifas ainda mais altas, incluindo uma taxa de 104% sobre a China.
- Pequim respondeu imediatamente, elevando sua retaliação para 84% e aplicando restrições a empresas americanas. O mundo parecia à beira de uma guerra comercial total.
Foi então que, no meio da tarde, veio a reviravolta de Trump:
- A “Pausa”: Anúncio de um limite de 10% por 90 dias para as tarifas retaliatórias sobre dezenas de países (aqueles que seriam taxados acima disso), abrindo uma janela para negociação.
- O Ataque à China: Simultaneamente, elevação da tarifa específica sobre a China para 125% (totalizando 145% com taxas pré-existentes).
A reação inicial dos mercados, especialmente nos EUA e no Brasil, foi de euforia: o S&P 500 teve seu melhor dia desde 2008, o Nasdaq desde 2001, o Ibovespa subiu mais de 3% e o dólar despencou no Brasil. A interpretação dominante foi que, apesar da dureza contra a China, a “pausa” para os demais afastava o risco de um colapso comercial generalizado e imediato.
Quinta-Feira, A Manhã Seguinte: A ‘Ressaca’ da Realidade
A euforia, contudo, durou pouco. Nesta quinta-feira, os mercados nos EUA e no Brasil “acordaram” para a complexidade da situação:
- A “pausa” é temporária e condicionada a negociações.
- A tarifa de 145% sobre a China é real, massiva e com potencial disruptivo imenso para cadeias globais.
- A retaliação chinesa de 84% também está em vigor.
O foco voltou para o confronto direto EUA-China, como destacado por analistas do Rabobank, e a percepção de risco retornou, derrubando as bolsas e fortalecendo o dólar globalmente, especialmente contra moedas emergentes como o Real. A volatilidade do dólar no Brasil – de R$ 6,09 na máxima de quarta para R$ 5,84 no fechamento, e voltando a subir para R$ 5,94 na quinta – é o retrato fiel desse nervosismo e da dificuldade em precificar o risco real.
Caminhos Divergentes: O Mundo Absorve a Notícia em Ritmos Diferentes
A reação global nesta quinta-feira não foi uniforme, refletindo diferentes exposições e o tempo de absorção das notícias:
- Europa: Viveu seu dia de euforia. O índice STOXX 600 saltou mais de 4%, com os investidores reagindo positivamente tanto à “pausa” de Trump (anunciada após o fechamento europeu de quarta) quanto à decisão da União Europeia, anunciada hoje por Ursula von der Leyen, de também suspender suas contramedidas por 90 dias, priorizando o diálogo.
- Ásia: Mercados como China e Hong Kong continuaram em alta, parecendo minimizar o impacto direto das tarifas de 125% e focando, talvez, na possibilidade de negociação aberta pela “pausa” para outros países (visão do estrategista do Bank of East Asia) ou em fatores internos como o bom desempenho de ações de tecnologia chinesas listadas nos EUA.
Essa divergência demonstra como a política comercial errática dos EUA cria ondas de choque que se propagam de forma distinta, fragmentando a resposta do mercado global.
Sinais Econômicos versus Ruído Político
Para complicar a leitura do cenário, dados importantes da economia americana divulgados hoje apontaram para uma inflação ao consumidor (CPI) mais fraca que o esperado em março (inclusive no núcleo). Em condições normais, isso fortaleceria as apostas em cortes de juros pelo Federal Reserve (o que de fato ocorreu, com o mercado precificando 1 ponto percentual de corte até o fim do ano) e tenderia a enfraquecer o dólar globalmente.
Contudo, a força do “ruído” geopolítico foi tão grande que, pelo menos no mercado brasileiro, esse sinal fundamental foi ignorado. O dólar subiu contra o Real, indicando que a aversão ao risco e a busca por segurança (representada pelo dólar como moeda de reserva global) superaram a influência dos dados macroeconômicos e das expectativas sobre o Fed.
Conclusão: Uma Semana de Incerteza e Volatilidade como Norma
Ao final desta sequência de eventos turbulentos, fica a imagem de um mercado global refém da imprevisibilidade da política comercial americana. A semana foi uma montanha-russa, alternando pânico, alívio e renovada ansiedade em questão de horas. A “pausa” tarifária para alguns pode ter evitado o pior cenário imediato, mas a escalada sem precedentes contra a China e a natureza errática das decisões mantêm a incerteza em níveis elevadíssimos. Para o Brasil e outros mercados emergentes, a lição é clara: a volatilidade induzida por fatores externos é uma constante a ser gerenciada, e a dependência de humores políticos das grandes potências torna a navegação econômica ainda mais desafiadora. A pergunta que fica é se esta semana foi um ponto fora da curva ou o prenúncio de uma nova era de instabilidade crônica no comércio global.