Precatórios: o rombo que volta ao centro das contas públicas
Precatórios são dívidas judiciais que a União precisa pagar após condenações definitivas. Desde 2022, parte desses valores vinha sendo adiada ou contabilizada fora da meta fiscal, o que ajudava a aliviar momentaneamente a pressão sobre o orçamento.
Mas essa trégua tem data para acabar.
De acordo com o PLDO de 2026 (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias), os precatórios voltarão a entrar integralmente nas contas a partir de 2027. O impacto será direto: menos dinheiro para investimentos, obras, serviços públicos e políticas sociais.
As projeções oficiais mostram um cenário preocupante:
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R$ 50,7 bilhões em precatórios em 2026
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R$ 60,6 bilhões até 2029
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Queda de quase R$ 200 bilhões nas verbas discricionárias (gastos não obrigatórios) no mesmo período
Economia pressionada, política em primeiro plano
O governo admite que o problema é grave, mas, por enquanto, evita propor mudanças. E o motivo, segundo economistas, é eleitoral.
Apresentar agora uma solução realista exigiria medidas duras — e impopulares.
“O atual governo não quer mexer nisso em 2025, porque está preocupado com 2026”, resume Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
A inflação em alta e os índices de avaliação negativa crescendo em pesquisas reforçam a cautela do Planalto. Segundo os analistas, a lógica política é simples: evitar desgaste agora para tentar garantir capital eleitoral no próximo ano.
Arcabouço fiscal à prova: metas ameaçadas antes mesmo de valerem
O novo arcabouço fiscal, criado para substituir o teto de gastos, prevê que as despesas públicas cresçam entre 0,6% e 2,5% acima da inflação, conforme o desempenho da arrecadação.
Mas, na prática, as despesas obrigatórias — como aposentadorias, salários e os próprios precatórios — já consomem toda a margem da regra.
A economista Rafaela Vitoria, do Banco Inter, destaca que, com os precatórios voltando integralmente ao orçamento, o déficit primário se estenderá pelo quarto ano seguido.
“As projeções mostram que o arcabouço não se sustenta a partir de 2027 sem cortes profundos — o que não é politicamente viável hoje.”
Incerteza fiscal preocupa o mercado e trava investimentos
A situação fiscal não afeta apenas o governo. Ela impacta diretamente a credibilidade do país diante de investidores, agências de classificação de risco e empresas que dependem de previsibilidade para operar.
Para Solange Srour, economista do UBS Global Wealth Management, a demora do governo em agir terá consequências:
“Quanto mais tempo demorarmos para enfrentar esse problema, maior será o dano à máquina pública, ao investimento público e à confiança de quem financia o Estado brasileiro.”
Ela alerta que, sem ação imediata, 2027 marcará o início de um ciclo de cortes forçados, paralisação de programas e perda de capacidade de planejamento.
Um futuro fiscal que se complica
Enquanto o governo aposta na postergação, os números mostram um caminho estreito:
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Precatórios podem ultrapassar R$ 120 bilhões em 2026
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O espaço para novos investimentos deve praticamente desaparecer
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A meta de superávit primário de 1,5% até 2029 parece cada vez mais distante
A falta de resposta efetiva abre margem para o desgaste político no médio prazo — justamente o que o Planalto tenta evitar agora.
Escolha adiada, conta antecipada
O dilema está posto: enfrentar agora a fatura fiscal e assumir o custo político, ou seguir empurrando e enfrentar um cenário ainda mais difícil no próximo mandato. Por enquanto, a escolha parece clara: garantir tranquilidade eleitoral em 2026 e deixar para depois o que pode estourar em 2027.